Proporciona
efetivamente a carne energias extraordinárias? Tem-se
pensado freqüentemente e repetido com insistência
que a alimentação na base de carne torna os
homens extraordinariamente capazes de rendimento e fortes.
A tribo hunsa, que vive na região do Himalaia,
é sem dúvida um exemplo vivo de que a renúncia
à alimentação cárnea não
só não prejudica como também traz vantagens
que, ao que parece, ainda não conhecemos suficientemente.
O Dr. H. Balzli já em 1928 havia exposto as
observações do médico inglês McCarrison,
que este fizera durante a sua permanência de nove
anos na região de Hunsar-Nagar, no Himalaia, estudando
as características dos seus habitantes.
Os hunsas não comem nenhuma carne, alimentando-se de vegetais e leite. As
suas habitações são primitivas e os meios de aquecimento são muito elementares.
E, contudo, os hunsas são um dos povos mais belos, fortes e resistentes
da Terra.
A sua capacidade de resistência contra as doenças contagiosas é assombrosa. Não
há entre eles úlceras do estômago, nem apendicites, dispepsias ou catarros
intestinais.
O Dr. Ralph Bircher, que recentemente deu informações minuciosas,
sobre a tribo hunsa, compara os hunsas com os esquimós da Groenlândia oriental,
cujo modo de vida estudou a expedição Höygaard, em 1936. Escreveu ele:
Mais de 90 % da alimentação destes esquimós consiste em carne, quase
sempre crua. A alimentação é muito natural, mas não corresponde às condições
humanas. Não dá lugar a insuficiências consideráveis de vitaminas ou sais minerais,
mas dá lugar à ingestão diária de 299 g de albumina animal, em lugar de 60 g, 169 de gordura em lugar de 50 a 80 g e só 122 g de
hidrocarbonatos, em lugar de 400 a 500 g. Estes homens parecem sãos, ativos,
alegres, amantes do trabalho e inteligentes, quando muito jovens, isto é, entre
os vinte e os vinte e cinco anos; mas, quando chegam aos trinta e cinco anos
perderam a sua juventude, a sua energia e a sua capacidade e mostram-se
cansados, entorpecidos e gravemente arterioscleróticos. A duração média da vida
destes homens é só de vinte e sete anos e meio. Compare-se tudo isto com a
juventude, o aspecto, a capacidade e a atividade dos hunsas, de idade muito
avançada. Isto demonstra, pois, que a alimentação hunsa, crua e vegetal, de
cereais integrais com suficiente acréscimo de verduras, é própria para as
características naturais do organismo humano, e não o é, pelo contrário, a
alimentação dos esquimós.
Prejuízos de uma Alimentação Exclusivamente Cárnea -- Com respeito
à questão tantas vezes levantada, se a carne é prejudicial como alimento, só
podemos dizer por agora que, como todos os meios de alimentação e cura,
constitui um problema de quantidade e de qualidade. Em determinadas
manifestações de anemia pode até mesmo ser curativo em alto grau o suco de carne
fresca prensada (Czerny).
Se se passar de uma quantidade determinada, que é muito diferente de
indivíduo para indivíduo, então o consumo de carne provoca prejuízos, sobretudo
se a carne for o alimento principal.
0 Prof. Gänsslen pôs alguns jovens estudantes em regime exclusivo
diário de 1.500 g de carne, 30 g de pão branco e limonada. Passados dez dias foi
possível verificar, mediante o microscópio capilar, nos vasos capilares, grandes
mudanças e lesões. Os vasos, normalmente finos e delgados, em forma de
forquilha, tinham-se tornado grossos, enroscados e grandes, tendo inclusive
rebentado nalguns pontos, de modo que o sangue de hemorragia tinha invadido os
tecidos imediatos. Exteriormente, a pele parecia avermelhada, não num tom
encarnado vivo, mas mais azulado, ao passo que as gengivas apresentavam-se
inchadas e sangrentas. Foi necessária uma prolongada abstinência de carne para a
retificação das alterações naqueles vasos. Já há mais de vinte anos o Dr. Bircher Benner indicava que o que aqui se efetuou a título experimental
com exagerado regime de carne durante dez dias, se realiza em milhões de casos
com a alimentação baseada no consumo de carne durante dez anos.
O Papel da Carne na Origem de Enfermidades Orgânicas -- O Prof. Gänsslen observou em estudantes sãos, depois de um regime cárneo, um aumento
da tensão arterial, prova também efetuada por outros investigadores no caso de
alimentação excessiva, sobretudo na base de carne. Sabe-se também que a atividade da tireóide é
estimulada pela nutrição com carne. As pessoas que já sofrem de excessiva
secreção desta glândula -- doença chamada hipertireoidismo -- podem, por uma
alimentação abundante de carne, piorar no seu estado clínico, ou responder
insuficientemente a um remédio. O excesso de alimentação, especialmente de
carne, é de importância essencial, sobretudo na arteriosclerose, no prejudicial
aumento de volume sangüíneo e de glóbulos vermelhos (policitemia), na trombose e
embolia, na formação de cálculos biliares, no aparecimento da psoríase, na
hipertrofia prostática e no desenvolvimento de miomas na matriz, assim como
provavelmente também no câncer. Um papel, cuja importância não podemos
menosprezar, é desempenhado pela alimentação cárnea na gota, nos cálculos renais
(sobretudo uráticos) e na provocação de reações alérgicas. Pelo contrário, o
regime vegetariano dificulta ou elimina a maioria dos estados alérgicos. Ao
passo que nos povos que consomem muita carne a apendicite não é precisamente
rara, a verdade é que só isoladamente se apresenta nos povos de regime
lácteo-vegetariano.
Efeitos Psíquicos do Consumo Excessivo de Carne -- É muito fácil
de compreender que o consumo excessivo de carne com a sua influência
considerável na condição física não deixa de influir nas funções nervosas, nas
reações anímicas e nas forças psíquicas. O Dr. Wildukind Lenz diz que a
abundância em gordura e carne na alimentação estimula a atividade da tireóide e
incrementa a excitabilidade do sistema nervoso simpático, de modo que os povos
de alimentação carnívora são de temperamento violento e agressivo, ao passo que
os povos que se alimentam de vegetais são tranqüilos e pacíficos. Os
puericultores têm observado que a alimentação sobrecarregada de carne, ovos e
leite, isto é, produtos portadores de albumina animal, implica um considerável
nervosismo.
Inconvenientes Sanitários -- É fácil citar a opinião de
autoridades médicas que não vêem na carne nenhum elemento essencial para a nossa
alimentação, e consideram, contudo, que as grandes quantidades consumidas
regularmente constituem para os seus usuários um grave prejuízo.
Temos, além disso, de dizer que não se podem passar por alto as condições
em que a carne é adquirida. No verão é preferível prescindir totalmente da carne
se não dispuser-mos de geladeira, até o momento em que vai ser usada. Cumpre
evitar na medida do possível a carne picada, porque às vezes é de origem
duvidosa ou está ilegalmente conservada por meios químicos, como o sulfito de
sódio, que dá à carne picada, mesmo armazenada durante bastante tempo, um fresco
colorido vermelho, mas sem poder impedir que as bactérias da putrefação se
multipliquem. Quando se inicia o desenvolvimento das bactérias, na realidade a
carne já está podre. Portanto, no consumo da carne picada tem esta de ser
preparada fresca. Estreitamente ligada com a questão que estamos tratando,
encontra-se a do emprego do sal vulgar, porque o uso de alimentos cárneos sem
sal é dificilmente aceito pelo paladar. Também não podemos olvidar que todo o
emprego de calor na preparação culinária modifica e prejudica os alimentos
proteínicos, ao passo que o consumo a cru faz correr o risco de se receberem
parasitas intestinais (tênia).
Os critérios econômicos podem passar-se por alto, embora não faltem
motivos graves que nos deviam levar a reduzir consideravelmente o consumo de
carnes.
Influência da Dieta Cárnea Sobre o Espírito - Em todos os tempos e
por todas as religiões importantes têm sido apresentados argumentos morais
baseados em claros e oportunos motivos para nos afastarmos do consumo da carne.
É fruto de velhíssima experiência expresso no mundo misterioso do sobrenatural e
do metafísico, que quem quiser penetrar nele tem de sacrificar a sua
sensualidade, neste caso o prazer da sua nutrição errada. Não nos será possível
um aperfeiçoamento autêntico, puro, espiritual e religioso, sem ascetismo, isto
é, naquilo que aqui nos interessa, sem nos privarmos de carne e de alimentos
semelhantes. Recordo apenas o exemplo de Gandhi, cuja conduta e doutrina
contra toda a espécie de violências e cuja grande capacidade de contemplação
interior dependia, em última análise, da sua maneira de viver. Usava duas vezes
por dia fruta, arroz, nozes e um pouco de leite. É, da mesma sorte, típico da
religião budista, dirigida para a vida pacífica, espiritual e de contemplação
interior, o proibir o consumo da carne.
Encerra muita verdade a diferenciação já muito divulgada entre o Ocidente
extrovertido (dirigido para o mundo exterior), e o Oriente introvertido
(dirigido para o mundo interior), cuja explicação se há de encontrar no fato de
os povos ocidentais serem de preferência carnívoros, e os orientais serem
sobretudo vegetarianos. Encontramos a mesma relação entre a alimentação e a
formação físico-espiritual expressa na fórmula de que nos povos carnívoros
predominam as reações do sistema simpático, e a atividade da tireóide, o
desenvolvimento físico e o temperamento decidido e agressivo, ao passo que nos
povos vegetarianos desempenham principal papel os hormônios das glândulas
vago-trópicas (insulina, colina) caracterizando-se o seu modo de ser pela
tranqüilidade e o pacifismo. Esta mesma verdade já foi exposta, há mais de um
século, por Karl Gustav Carus, médico, pintor, psicólogo e contemporâneo
de Goethe, que na sua obra «Briefen über Landschaftsmale rei» (Cartas sobre pintura paisagista) escreve que «finalmente, tanto os
homens como os animais com uma persistente alimentação com produtos vegetais se
tornam suaves e tranqüilos, ao passo que o consumo de carne parece favorecer
muito os desejos e os impulsos tormentosos».