O
soldado japonês típico da Segunda Guerra Mundial é lembrado
por sua cruel insensibilidade para com o sofrimento humano.
Como ex-prisioneiro, sei disso. Cheguei a compreender, entretanto,
que esses homens foram vítimas do sistema satânico
sob o qual serviam, pois eram tão indiferentes ao
sofrimento de seus próprios feridos como o eram para
com o dos inimigos.
Apesar dessa realidade, nem todos os soldados japoneses eram
insensíveis. Recordo bem de uma vez em que, tarde da
noite, um de nossos guardas foi na ponta dos pés até nossas
barracas e cuidadosamente cobriu os presos que se haviam descoberto
durante o sono. Também fiquei sabendo que o Tenente
Tomibe Rokuro, que foi nosso comandante por algum tempo, chorou
quando viu como a Kempeitai (polícia secreta) havia
torturado alguns de nossos homens.
Houve também exemplos de compaixão revelados
pelos aliados. Na Tailândia, onde minha esposa e eu trabalhamos
como voluntários de 1990 a 1992, soubemos de um trem
cheio de soldados britânicos que durante a Segunda Guerra
foi desviado para outra linha férrea para uma espera
demorada. Os britânicos ouviram os gemidos de japoneses
feridos em um trem próximo. Alguns foram investigar
e viram aqueles pobres homens num estado chocante de abandono.
Sem dizer palavra, e sob protestos da guarda japonesa, os britânicos
repartiram sua ração e a água, limparam
e fizeram curativos nos ferimentos dos japoneses da melhor
forma que puderam. Ao saírem, ouviram os agradecidos
soldados inimigos dizendo: "Arigato" (muito obrigado).
Um oficial aliado que havia observado a cena criticou os bons
samaritanos por terem "prestado ajuda e dado consolo ao inimigo".
Fizeram-no recordar, entretanto, que o Bom Samaritano original
ajudara um inimigo (S. João 4:9; S. Luc. 10:33) e, assim,
por que não poderiam eles fazer a mesma coisa?
Bondade
Para com Estranhos
Se o estrangeiro peregrinar na vossa terra, não o oprimireis.
Como o natural será entre vós o estrangeiro que
peregrina convosco; amá-lo-eis como a vós mesmos.
Lev. 19:33.
Era
domingo
à noite, 29 de dezembro de 1946. A primeira edição
do jornal Miami Herald havia acabado de ir para a impressão.
Timothy Sullivan, redator, preparava-se para ir para casa e
ter uma bem-merecida noite de descanso, quando seu telefone
tocou e uma voz de mulher começou a implorar:
- Por favor, me ajude! Meu marido está tendo uma hemorragia
e vai morrer!
O moribundo era Rudy Kovarik, do Estado de Michigan. Ele e
sua esposa estavam de férias na Flórida, quando
a úlcera do estômago dele começou a sangrar
e ele foi levado às pressas para o Hospital Biscayne.
Uma
úlcera sangrando não é necessariamente
uma ameaça à vida. A situação,
no entanto, era crítica porque o tipo de sangue de Kovarik
era raro, AB com RH negativo, e não estava sendo encontrado
em toda a região. A menos que um doador com aquele tipo
de sangue fosse localizado em pouco tempo, os médicos
temiam que Kovarik não amanhecesse vivo.
O que poderia fazer um redator de jornal? Um homem estava morrendo.
Sullivan teve uma idéia. Telefonou para a emissora de
rádio WCBS, alguns quarteirões adiante, e pediu
para falar com o locutor Walter Winchell, que devia ir ao ar
dentro de minutos com o noticiário. Relutantemente,
o telefonista permitiu que Sullivan falasse com Winchell. Dentro
de poucos minutos, Winchell irradiou a notícia acerca
de Kovarik, dando o nome do paciente e os números do
telefone do hospital, do posto policial e do escritório
do redator do Miami Herald.
Dentro de minutos, esses telefones ficaram congestionados com
ligações vindas de todo o país, oferecendo
doações de sangue. Um dos oferecimentos veio
de um soldado que estava de licença, hospedado num hotel
a uns dois quarteirões do hospital. Dentro de minutos,
o sangue transportador de vida fluía para dentro das
veias do debilitado paciente. A vida de Kovarik foi salva.
Algumas semanas mais tarde, Sullivan obteve a recompensa quando
o agora restabelecido Kovarik entrou em seu escritório
para expressar-lhe gratidão, não mais como um
estranho, mas como amigo.
Às vezes somos recompensados nesta vida por demonstrar bondade, mas
não contemos com isso. Sejamos bondosos para com os outros, não
porque pode aparecer alguma recompensa, mas porque o amor de Cristo nos constrange
a fazer o bem.
Nobre
Vingança
Evitai que alguém retribua a outrem mal por mal; pelo
contrário, segui sempre o bem, entre vós, e para
com todos. I Tes. 5:15.
Certo
dia, um oficial do exército bateu num jovem soldado
que era conhecido por praticar artes marciais. O golpe era
injustificado, mas os regulamentos militares proibiam o revide;
além disso, o jovem era cristão.
- O senhor ainda vai se arrepender disso - comentou o soldado
com um sorriso.
Tempos depois, a companhia daquele soldado estava envolvida
numa feroz batalha, quando ele viu um oficial ferido tentando
desesperadamente arrastar-se de volta para a trincheira. O
jovem soldado reconheceu-o como o oficial que o havia golpeado.
Arriscando a própria vida, foi em auxílio do
homem ferido e ajudou-o a ir a um posto de primeiros socorros.
Enquanto o oficial jazia deitado no chão, esperando
que os médicos o atendessem, tomou a mão do soldado,
gaguejou um pedido de desculpas e expressou-lhe gratidão.
Apertando a mão do oficial, o jovem soldado deu uma
risadinha amigável e disse: "Eu tinha certeza de que
algum dia o senhor se arrependeria." Dali em diante, os dois
tornaram-se os melhores amigos.
Durante a Segunda Guerra Mundial, Desmond T. Doss, um soldado
cristão não-combatente, foi ridicularizado por
causa de sua fé, até mesmo por alguns dos oficiais.
Durante a campanha de Okinawa, um daqueles oficiais foi gravemente
ferido. Doss também arriscou a vida para salvá-lo.
Salvou igualmente a vida de muitos outros homens feridos, alguns
dos quais haviam anteriormente zombado dele. Em reconhecimento
por sua coragem, uma nação grata concedeu-lhe
a Medalha de Honra do Congresso, a mais alta condecoração
por bravura outorgada pelos Estados Unidos - e a primeira dessas
medalhas a ser dada a um não-combatente.
Pague
o Mal com o Bem
Não pagando mal por mal, ou injúria por injúria;
antes, pelo contrário, bendizendo, pois para isto mesmo
fostes chamados. I S. Ped. 3:9.
Li
pela primeira vez acerca de Jacob de Shazer no jornal San
Francisco Chronicle, no final de 1945 ou início de
1946. Isso aconteceu apenas alguns meses após a minha
libertação do campo de concentração
nas Filipinas.
Shazer foi um dos participantes dos ataques de surpresa sobre
o Japão, no dia 18 de abril de 1942. Durante o ataque,
o avião de Shazer foi atingido por fogo antiaéreo.
Ele foi forçado a acionar o ejetor e acabou sendo capturado.
Em terra, viu dois de seus companheiros sendo executados por
um pelotão de fuzilamento. Teve a certeza de que seria
executado também, mas parecia que Deus tinha outros
planos para ele.
Na ocasião em que foi capturado, Shazer era ateu, mas
durante os meses de prisão começou a ponderar
e querer descobrir por que odiava seus captores e por que eles
o odiavam. Ao buscar respostas, procurou recordar-se do que
havia aprendido sobre o cristianismo. Um dia, ele pediu aos
guardas uma Bíblia. Inicialmente eles riram, mas em
maio de 1944 um dos guardas jogou uma Bíblia contra
ele, dizendo que podia ficar com ela por três semanas,
no máximo.
Conforme havia dito, três semanas depois o guarda tomou
a Bíblia de volta, mas naquele período de tempo
a vida de Shazer mudara. Lembro-me de ter lido no jornal sobre
como ele pretendia retornar ao Japão como missionário.
A decisão dele me influenciou a desejar ir também
para o Japão como missionário, mas Deus tinha
outros planos. No caso de Shazer, entretanto, isso aconteceu
e ele partiu em 1948. Ao fazê-lo, retribuiu com o bem
o mal que lhe haviam causado. Mostrou o genuíno espírito
de um cristão.
Embora eu possa dizer com sinceridade que nunca odiei os japoneses,
não posso afirmar que os tenha amado ativamente enquanto
estive no campo de concentração. Com Cristo foi
diferente. Ele amou a todos com "amor eterno" (Jer. 31:3),
até mesmo àqueles que O amaldiçoaram,
maltrataram e crucificaram (ver S. Luc. 23:34). Sua vida e
morte são um exemplo vivo de como devemos portar-nos
em relação com aqueles que nos maltratam (ver
S. Mat. 5:44).
"Tende em vós o mesmo sentimento que houve também em Cristo Jesus."
Filip. 2:5.